TOLEDO,
Francisco de Assis. Princípios básicos de
direito penal: de acordo com a Lei n. 7.209, de 11-7-1984 e com a Constituição
Federal de 1988. – 5. ed. – São Paulo: Saraiva: 1994. p.50-53
Concurso
aparente de normas ou de leis penais
(...) entre
as duas normas penais em foco, existe uma certa relação de hierarquia, de modo
que a aplicação de uma esgota a punição do fato, excluindo a aplicação
cumulativa de outra. O concurso de normas não existia, em verdade, era só
aparente.
(...) [há] várias
espécies de “concurso aparente de normas”, para cuja solução a doutrina
predominante oferece alguns critérios a seguir expostos.
a) “Lex specialis
derogat legi generali”
59. Se
entre duas ou mais normas legais existe uma relação de especialidade, isto é, de gênero para espécie, a regra é de que a
norma especial afasta a incidência da norma geral. Considera-se especial (lex specialis) a norma que contém todos
os elementos da geral (lex generalis)
e mais um elemento especializador. Há, pois, em a norma especial um plus, isto é, um detalhe a mais que
sutilmente a distingue da norma geral. (...)
b) “Lex primaria
derogat legi subsidiariae”
60. (...)
há subsidiariedade quando diferentes normas protegem o mesmo bem jurídico em
diferentes fases, etapas ou graus de agressão. Nessa hipótese o legislador, ao
punir a conduta da fase anterior, fá-lo com a condição de que o agente não
incorra na punição da fase posterior, mais grave, hipótese em que só esta
última prevalece. Expor a perigo a vida de outrem constitui o crime do art. 132
do Código Penal, cuja detenção é de três meses a um ano “se o fato não
constitui crime mais grave”. Essa norma é subsidiária em relação à da tentativa
de homicídio, etapa mais grave subsequente da mera exposição a perigo.
A norma
secundária só é aplicável na ausência de outra norma – a norma primária -, já
que esta última envolve por inteiro a primeira.
A
subsidiariedade é expressa quando a própria lei ressalva a possibilidade de
ocorrência de punição por fato mais grave, como ocorre no art. 132, citado. (...)
Nem sempre a subsidiariedade vem expressa na lei. Há subsidiariedade tácita nos
tipos delitivos que descrevem fase prévia, de passagem necessária para a
realização do delito mais grave cuja punição abrange todas as etapas anteriores
de execução. Assim ocorre com a tentativa em relação ao crime consumado, com as
lesões corporais em relação ao homicídio etc. (...)
c) “Lex consumens
derogat legi consumptae” [Consunção]
(...) Há,
na lei penal, tipos mais abrangentes e tipos mais específicos que, por visarem
a proteção de bens jurídicos diferentes, não se situam numa perfeita relação de
gênero para espécie (especialidade) nem se colocam numa posição de maior ou
menor grau de execução do crime. Um exemplo disse temos na violação do
domicílio (CP, art. 150), que lesa a liberdade da pessoa, e no furto (art.
155), lesivo ao patrimônio.
Se,
todavia, a violação da residência é o meio empregado para a consumação do
furto, a punição deste último crime absorve a punibilidade do primeiro. A norma
mais ampla, mais abrangente, do furto, ao incluir como um de seus elementos
essenciais a subtração, ou seja, o
apossamento da coisa contra a vontade do dono, abrange a hipótese de penetração
na residência, contra a vontade do dono, para o apossamento da coisa. Essa norma
mais ampla consome, absorve a proteção parcial que a outra menos abrangente
objetiva.
Note-se que
a violação do domicílio não é etapa ou passagem necessária para o furto, como
ocorre com a lesão corporal em relação ao homicídio, pelo que a aplicação do
princípio da subsidiariedade tácita seria discutível, embora defensável. Mas,
estando esse fato prévio abrangido pela prática do crime mais grave, numa
relação de meio para fim, é por este consumido ou absorvido.
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